Expedição estuda navio escravagista que naufragou em Angra dos Reis em 1852

'Fantástico' acompanhou - com exclusividade - a primeira expedição ao sítio arqueológico onde o navio está. 'Fantástico' acompanha expedição para estudar navio escravagista naufragado Reprodução/TV Globo Em 1852, dois anos depois da proibição do tráfico de pessoas no Brasil, um navio escravagista chegou na costa de Angra dos Reis (RJ), trazendo mais de 500 africanos de Moçambique. Com medo de ser pego, o capitão colocou fogo na embarcação e ela naufragou. O local exato do naufrágio só foi encontrado em 2023, depois de 15 anos de pesquisa. O "Fantástico" acompanhou - com exclusividade - a primeira expedição ao sítio arqueológico onde o navio está. O tal navio é parte da memória do quilombo Santa Rita do Bracuí, de Angra dos Reis (RJ). "Veio um navio do estrangeiro, que a gente não sabia nem falar o nome, de onde era, com muitos negros dentro. E a polícia marítima e a marinha bateram em cima pra pegar o navio que não podia mais trazer pessoas e o capitão resolve afundar o navio", diz a matriarca Marilda de Souza Francisco. "Achava que era uma lenda. Eu achava que era invenção do meu pai." Milhares de africanos escravizados chegaram de forma ilegal e foram levados à força para vários lugares do Brasil. No meio do mar, um navio escravagista naufragou carregado de histórias que comprovam um dos maiores crimes contra a humanidade. Para descobrir os detalhes não é preciso ir muito fundo. Embaixo de todo o lodo e areia, a 8 metros de profundidade, está o Brigue Camargo, o primeiro navio escravagista encontrado e estudado na costa brasileira. Até hoje, apenas seis foram localizados no mundo. Existem duas versões para a história do naufrágio. O relato oficial diz que os africanos que sobreviveram à viagem conseguiram escapar em canoas. A história oral fala que o casco se rompeu e que todos morreram. Dez anos depois de fugir do país, o capitão norte-americano Nathaniel Gordon foi preso nos Estados Unidos. "Ele foi enforcado. O único, que eu saiba, traficante enforcado pelo crime de trazer africanos para as Américas", afirma a historiadora Martha Abreu. "Quando a gente fala de um naufrágio, a gente está falando de restos de uma embarcação, porque grande parte desse material, ele se deteriora com o passar do tempo", diz o arqueólogo Luis Felipe Santos, um dos responsáveis pela expedição e presidente do Instituto Afrorigens, um projeto que pesquisa naufrágios escravagistas. "Então, sempre quando a gente começa a estudar um sítio arqueológico, a gente está montando esse quebra-cabeça, mas a gente sabe que muitas peças vão estar faltando." A embarcação naufragou próximo à foz do rio Bracuí, onde tem muita lama. Pelas gravações, dá pra ver como a água clarinha vira uma grande neblina no fundo do mar. Por causa disso, muitas das descobertas são feitas apenas com o toque, sem depender tanto da visão. "A gente encontra madeira carbonizada em toda a área do sítio arqueológico, o que mostra que realmente essa embarcação foi incendiada. Ficou como uma fogueira flutuante até começar a afundar e se acomodar no fundo do mar", conta Santos. O local é patrimônio nacional protegido e registrado pelo Iphan. Por isso, é crime federal, mergulhar ou tentar retirar qualquer peça do navio. A pesquisa é financiada por várias instituições brasileiras e pelo Slave Wrecks Project, uma parceria internacional que estuda o tráfico marítimo de escravizados. No início de dezembro, o Consulado Geral dos Estados Unidos no Rio de Janeiro anunciou um investimento de US$ 295 mil no projeto de conservação do Brigue Camargo. Os antepassados da Marilda, a principal liderança da comunidade, estão entre os que permaneceram nas terras do Bracuí. Em 1856, essas terras foram deixadas como herança, de papel passado, para as famílias que ainda viviam por lá. O antigo dono da fazenda, José de Sousa Breves, não tinha filhos e o local tinha perdido o valor, já que o tráfico de pessoas estava proibido no Brasil. Mesmo assim, a comunidade luta até hoje pela titulação da terra. Ouça os podcasts do Fantástico ISSO É FANTÁSTICO O podcast Isso É Fantástico está disponível no g1, Globoplay, Deezer, Spotify, Google Podcasts, Apple Podcasts e Amazon Music trazendo grandes reportagens, investigações e histórias fascinantes em podcast com o selo de jornalismo do Fantástico: profundidade, contexto e informação. Siga, curta ou assine o Isso É Fantástico no seu tocador de podcasts favorito. Todo domingo tem um episódio novo. PRAZER, RENATA O podcast 'Prazer, Renata' está disponível no g1, no Globoplay, no Deezer, no Spotify, no Google Podcasts, no Apple Podcasts, na Amazon Music ou no seu aplicativo favorito. Siga, assine e curta o 'Prazer, Renata' na sua plataforma preferida. BICHOS NA ESCUTA O podcast 'Bichos Na Escuta' está disponível no g1, no Globoplay, no Deezer, no Spotify, no Google Podcasts, no Apple Podcasts, na Amazon Music ou no seu aplicativo favorito.

Dez 29, 2024 - 22:30
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Expedição estuda navio escravagista que naufragou em Angra dos Reis em 1852

'Fantástico' acompanhou - com exclusividade - a primeira expedição ao sítio arqueológico onde o navio está. 'Fantástico' acompanha expedição para estudar navio escravagista naufragado Reprodução/TV Globo Em 1852, dois anos depois da proibição do tráfico de pessoas no Brasil, um navio escravagista chegou na costa de Angra dos Reis (RJ), trazendo mais de 500 africanos de Moçambique. Com medo de ser pego, o capitão colocou fogo na embarcação e ela naufragou. O local exato do naufrágio só foi encontrado em 2023, depois de 15 anos de pesquisa. O "Fantástico" acompanhou - com exclusividade - a primeira expedição ao sítio arqueológico onde o navio está. O tal navio é parte da memória do quilombo Santa Rita do Bracuí, de Angra dos Reis (RJ). "Veio um navio do estrangeiro, que a gente não sabia nem falar o nome, de onde era, com muitos negros dentro. E a polícia marítima e a marinha bateram em cima pra pegar o navio que não podia mais trazer pessoas e o capitão resolve afundar o navio", diz a matriarca Marilda de Souza Francisco. "Achava que era uma lenda. Eu achava que era invenção do meu pai." Milhares de africanos escravizados chegaram de forma ilegal e foram levados à força para vários lugares do Brasil. No meio do mar, um navio escravagista naufragou carregado de histórias que comprovam um dos maiores crimes contra a humanidade. Para descobrir os detalhes não é preciso ir muito fundo. Embaixo de todo o lodo e areia, a 8 metros de profundidade, está o Brigue Camargo, o primeiro navio escravagista encontrado e estudado na costa brasileira. Até hoje, apenas seis foram localizados no mundo. Existem duas versões para a história do naufrágio. O relato oficial diz que os africanos que sobreviveram à viagem conseguiram escapar em canoas. A história oral fala que o casco se rompeu e que todos morreram. Dez anos depois de fugir do país, o capitão norte-americano Nathaniel Gordon foi preso nos Estados Unidos. "Ele foi enforcado. O único, que eu saiba, traficante enforcado pelo crime de trazer africanos para as Américas", afirma a historiadora Martha Abreu. "Quando a gente fala de um naufrágio, a gente está falando de restos de uma embarcação, porque grande parte desse material, ele se deteriora com o passar do tempo", diz o arqueólogo Luis Felipe Santos, um dos responsáveis pela expedição e presidente do Instituto Afrorigens, um projeto que pesquisa naufrágios escravagistas. "Então, sempre quando a gente começa a estudar um sítio arqueológico, a gente está montando esse quebra-cabeça, mas a gente sabe que muitas peças vão estar faltando." A embarcação naufragou próximo à foz do rio Bracuí, onde tem muita lama. Pelas gravações, dá pra ver como a água clarinha vira uma grande neblina no fundo do mar. Por causa disso, muitas das descobertas são feitas apenas com o toque, sem depender tanto da visão. "A gente encontra madeira carbonizada em toda a área do sítio arqueológico, o que mostra que realmente essa embarcação foi incendiada. Ficou como uma fogueira flutuante até começar a afundar e se acomodar no fundo do mar", conta Santos. O local é patrimônio nacional protegido e registrado pelo Iphan. Por isso, é crime federal, mergulhar ou tentar retirar qualquer peça do navio. A pesquisa é financiada por várias instituições brasileiras e pelo Slave Wrecks Project, uma parceria internacional que estuda o tráfico marítimo de escravizados. No início de dezembro, o Consulado Geral dos Estados Unidos no Rio de Janeiro anunciou um investimento de US$ 295 mil no projeto de conservação do Brigue Camargo. Os antepassados da Marilda, a principal liderança da comunidade, estão entre os que permaneceram nas terras do Bracuí. Em 1856, essas terras foram deixadas como herança, de papel passado, para as famílias que ainda viviam por lá. O antigo dono da fazenda, José de Sousa Breves, não tinha filhos e o local tinha perdido o valor, já que o tráfico de pessoas estava proibido no Brasil. Mesmo assim, a comunidade luta até hoje pela titulação da terra. Ouça os podcasts do Fantástico ISSO É FANTÁSTICO O podcast Isso É Fantástico está disponível no g1, Globoplay, Deezer, Spotify, Google Podcasts, Apple Podcasts e Amazon Music trazendo grandes reportagens, investigações e histórias fascinantes em podcast com o selo de jornalismo do Fantástico: profundidade, contexto e informação. Siga, curta ou assine o Isso É Fantástico no seu tocador de podcasts favorito. Todo domingo tem um episódio novo. PRAZER, RENATA O podcast 'Prazer, Renata' está disponível no g1, no Globoplay, no Deezer, no Spotify, no Google Podcasts, no Apple Podcasts, na Amazon Music ou no seu aplicativo favorito. Siga, assine e curta o 'Prazer, Renata' na sua plataforma preferida. BICHOS NA ESCUTA O podcast 'Bichos Na Escuta' está disponível no g1, no Globoplay, no Deezer, no Spotify, no Google Podcasts, no Apple Podcasts, na Amazon Music ou no seu aplicativo favorito.