Conheça investimentos e técnicas da construção com foco na sustentabilidade
As alternativas para uma construção com menos emissão de carbono Na série especial de reportagens sobre sustentabilidade na construção, a Janaína Lepri mostra, nesta quinta-feira (25), o trabalho desse setor para diminuir as emissões de carbono. Em uma obra, fazer conta é sempre difícil. Calcular o custo ambiental é ainda mais complicado. A construção civil responde por um quinto das emissões globais de CO₂. É muito, mas antes de apontarmos “vilões”, é preciso olhar para os materiais mais usados nas obras e considerar a escala de produção, a viabilidade econômica e a durabilidade: 7% do CO₂ lançado na atmosfera vêm da fabricação de aço, alumínio e concreto. É que na mistura do concreto vai cimento. E, para se ter uma ideia, produzir uma tonelada do material libera quase uma tonelada de CO₂. Mais do que de pedra, a selva é de concreto e aço. Nem sempre sinônimos de moradia segura. Os conhecimentos da arquiteta Ester Carro sobre arquitetura das favelas vão além do que aprendeu na faculdade. Ela mora no Complexo de Paraisópolis, em São Paulo. Já viveu em uma casa precária, como muitas que hoje trabalha para transformar. Não teve salvação. Foi preciso derrubar as paredes velhas e erguer novas para acabar com as infiltrações e trazer mais luz para casa toda. “O quarto não tinha nenhuma janela, agora a gente vai ter. Quando a gente pensa nessas novas aberturas, não são aberturas assim pequenas não. A gente pensa realmente em aberturas generosas”, diz a arquiteta Ester Carro. O projeto social tem orçamento apertado e, por isso, sustentabilidade é questão de sobrevivência. A Ester reaproveita materiais que iriam parar em uma caçamba de entulho. É o "design circular". “A gente faz conexões com empresas - principalmente escritório de arquitetura, de engenharia. E a gente recebe a doação desses materiais. A gente faz um processo inverso. A gente pensa na vida útil desse material. Quanto mais tempo a gente tiver utilizando esse material, menos impacto a gente vai ter no meio ambiente”, diz Ester Carro. O design circular diminui o desperdício de material de construção. Por exemplo, o piso dos quartos vai ser revestido com um laminado de madeira que sobrou de uma outra obra e seria descartado. “Hoje, nas obras, 35% dos materiais são feitos com reaproveitamento. Então, imagine só a economia. A gente consegue impactar mais gente e a gente consegue, também, essa questão da sustentabilidade muito presente", conta Ester Carro. Conheça investimentos e técnicas da construção com foco na sustentabilidade Jornal Nacional/ Reprodução A Roseli Ferreira da Silva, dona da casa, não vê a hora de se mudar: “Muito empolgada, porque eu não tinha esperança mais assim de ver a casa, sabe, arrumada assim mais”, afirma. “É muito importante ter toda a estrutura sendo refeita, levar em consideração se a casa não está em cima de um córrego. Por isso que a gente até chama, dentro da organização, de ações socioambientais. Porque não é só o social. É o ambiental, é o sustentável também. É o pensar no meio ambiente”, explica Ester Carro. Já faz quase dois anos que outra casa, de apenas 11 m², ficou pronta. A pia, a torneira, a madeira dos móveis, a porta do banheiro, o tanque e os revestimentos: tudo sobra de outras obras. "Às vezes, sobra ali 4 m², 5 m², e para essas casas tão pequenas que a gente trabalha, a gente consegue fazer o reaproveitamento de tudo”, afirma Ester. “Eu acho que pensar em construção sustentável é pensar em solução para esse tipo de obra. Obra que é a obra comum, é aquela reforma do banheiro. Tudo isso é muito importante”, diz Vanderley John, coordenador do Centro de Construção e Inovação Sustentável e professor Poli-USP. O professor Vanderley coordena o Centro de Inovação em Construção Sustentável da Universidade de São Paulo. Diz que baixar o impacto ambiental do setor depende de reduzir emissões dos materiais básicos: “O cimento, o aço, tudo que vai para forno precisa de energia para mover o forno, está emitindo CO₂”, afirma. Construções sustentáveis: usar o que tem à mão é a essência das bioconstruções O novo prédio do laboratório é uma "obra-teste" - ver para crer que materiais sustentáveis funcionam. Mas nem sempre a gente nota a diferença só de olhar. O concreto aplicado na laje parece comum, mas tem uma pegada de carbono 40% menor. Os pesquisadores mexeram na fórmula do cimento, aumentando a proporção de um derivado do calcário, rocha comum no Brasil. “A gente precisa aprender a usar aquilo que tem no local. Explorar ao máximo o que a gente tem de coisa muito abundante na natureza local e que não dá problema ambiental”, afirma Vanderley John. Um outro caso em que as "aparências enganam": a coluna do prédio parece igual a qualquer outra. Mas a diferença está no vergalhão de aço, fabricado com sucata reciclada fundida em fornos movidos à energia eólica. “Fisicamente, esse aço é idêntico ao aço convencional. E as propriedades técnicas são mantidas, e toda a normativa brasileira, tudo se mantém”, diz Vitória Damascen


As alternativas para uma construção com menos emissão de carbono Na série especial de reportagens sobre sustentabilidade na construção, a Janaína Lepri mostra, nesta quinta-feira (25), o trabalho desse setor para diminuir as emissões de carbono. Em uma obra, fazer conta é sempre difícil. Calcular o custo ambiental é ainda mais complicado. A construção civil responde por um quinto das emissões globais de CO₂. É muito, mas antes de apontarmos “vilões”, é preciso olhar para os materiais mais usados nas obras e considerar a escala de produção, a viabilidade econômica e a durabilidade: 7% do CO₂ lançado na atmosfera vêm da fabricação de aço, alumínio e concreto. É que na mistura do concreto vai cimento. E, para se ter uma ideia, produzir uma tonelada do material libera quase uma tonelada de CO₂. Mais do que de pedra, a selva é de concreto e aço. Nem sempre sinônimos de moradia segura. Os conhecimentos da arquiteta Ester Carro sobre arquitetura das favelas vão além do que aprendeu na faculdade. Ela mora no Complexo de Paraisópolis, em São Paulo. Já viveu em uma casa precária, como muitas que hoje trabalha para transformar. Não teve salvação. Foi preciso derrubar as paredes velhas e erguer novas para acabar com as infiltrações e trazer mais luz para casa toda. “O quarto não tinha nenhuma janela, agora a gente vai ter. Quando a gente pensa nessas novas aberturas, não são aberturas assim pequenas não. A gente pensa realmente em aberturas generosas”, diz a arquiteta Ester Carro. O projeto social tem orçamento apertado e, por isso, sustentabilidade é questão de sobrevivência. A Ester reaproveita materiais que iriam parar em uma caçamba de entulho. É o "design circular". “A gente faz conexões com empresas - principalmente escritório de arquitetura, de engenharia. E a gente recebe a doação desses materiais. A gente faz um processo inverso. A gente pensa na vida útil desse material. Quanto mais tempo a gente tiver utilizando esse material, menos impacto a gente vai ter no meio ambiente”, diz Ester Carro. O design circular diminui o desperdício de material de construção. Por exemplo, o piso dos quartos vai ser revestido com um laminado de madeira que sobrou de uma outra obra e seria descartado. “Hoje, nas obras, 35% dos materiais são feitos com reaproveitamento. Então, imagine só a economia. A gente consegue impactar mais gente e a gente consegue, também, essa questão da sustentabilidade muito presente", conta Ester Carro. Conheça investimentos e técnicas da construção com foco na sustentabilidade Jornal Nacional/ Reprodução A Roseli Ferreira da Silva, dona da casa, não vê a hora de se mudar: “Muito empolgada, porque eu não tinha esperança mais assim de ver a casa, sabe, arrumada assim mais”, afirma. “É muito importante ter toda a estrutura sendo refeita, levar em consideração se a casa não está em cima de um córrego. Por isso que a gente até chama, dentro da organização, de ações socioambientais. Porque não é só o social. É o ambiental, é o sustentável também. É o pensar no meio ambiente”, explica Ester Carro. Já faz quase dois anos que outra casa, de apenas 11 m², ficou pronta. A pia, a torneira, a madeira dos móveis, a porta do banheiro, o tanque e os revestimentos: tudo sobra de outras obras. "Às vezes, sobra ali 4 m², 5 m², e para essas casas tão pequenas que a gente trabalha, a gente consegue fazer o reaproveitamento de tudo”, afirma Ester. “Eu acho que pensar em construção sustentável é pensar em solução para esse tipo de obra. Obra que é a obra comum, é aquela reforma do banheiro. Tudo isso é muito importante”, diz Vanderley John, coordenador do Centro de Construção e Inovação Sustentável e professor Poli-USP. O professor Vanderley coordena o Centro de Inovação em Construção Sustentável da Universidade de São Paulo. Diz que baixar o impacto ambiental do setor depende de reduzir emissões dos materiais básicos: “O cimento, o aço, tudo que vai para forno precisa de energia para mover o forno, está emitindo CO₂”, afirma. Construções sustentáveis: usar o que tem à mão é a essência das bioconstruções O novo prédio do laboratório é uma "obra-teste" - ver para crer que materiais sustentáveis funcionam. Mas nem sempre a gente nota a diferença só de olhar. O concreto aplicado na laje parece comum, mas tem uma pegada de carbono 40% menor. Os pesquisadores mexeram na fórmula do cimento, aumentando a proporção de um derivado do calcário, rocha comum no Brasil. “A gente precisa aprender a usar aquilo que tem no local. Explorar ao máximo o que a gente tem de coisa muito abundante na natureza local e que não dá problema ambiental”, afirma Vanderley John. Um outro caso em que as "aparências enganam": a coluna do prédio parece igual a qualquer outra. Mas a diferença está no vergalhão de aço, fabricado com sucata reciclada fundida em fornos movidos à energia eólica. “Fisicamente, esse aço é idêntico ao aço convencional. E as propriedades técnicas são mantidas, e toda a normativa brasileira, tudo se mantém”, diz Vitória Damasceno, gerente de sustentabilidade da Tegra Incorporadora. Conheça investimentos e técnicas da construção com foco na sustentabilidade Jornal Nacional/ Reprodução A incorporadora desenvolveu a tecnologia em parceria com a siderúrgica. Hoje, o aço sustentável é usado em todos os canteiros de obras da empresa. “A gente tem que estar de mãos dadas, bem andando junto com as metas em conjunto, para que todo mundo atinja o objetivo maior de redução de emissões”, afirma Vitória Damasceno. Parcerias também são uma especialidade da ONG que constrói casas emergenciais em favelas. Em um cenário em que faltam tempo e dinheiro, surgem soluções tecnológicas. Uma construção feita com blocos de plástico reciclado substituiu um barraco de madeira na comunidade que fica em Carapicuíba, na Grande São Paulo. “A gente começou a pesquisar muito materiais que fossem mais resistentes aos impactos da crise climática. Então, enchentes, ondas de calor, chuvas muito fortes. Encontrou também os blocos de plástico que são feitos de restos de plásticos da indústria. Então, ele é uma forma de, ao invés de descartar, você transformar esses restos em algo que vai trazer dignidade para uma pessoa. A gente acredita que é uma moradia emergencial, mas que muda significativamente a vida das pessoas”, conta Giovanna Maradei, gerente de comunicação da ONG Teto Brasil. Conheça investimentos e técnicas da construção com foco na sustentabilidade Jornal Nacional/ Reprodução A casa onde a dona de casa Luana Gabriela da Silva Souza mora com o filho de um ano. “Ele vivia no hospital. Depois que eu vim para cá, graças a Deus, nenhuma vez foi para o hospital. Eu acho aqui nem muito calor e nem muito frio. Acho bom”, diz Luana Gabriela da Silva. O professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP José Eduardo Baravelli diz que, muitas vezes, a necessidade é o motor da transformação: “Reciclagens já se incorporaram em normas técnicas e até em estudos como algo muito possível. O desafio ambiental na construção, aos poucos, está se revelando que ele não é mais tecnológico. Nós temos já os estudos, as produções e os materiais necessários. É um desafio cultural, de nós aceitarmos que eles são possíveis e que é possível que eles possam ser o material de muitas pessoas e um material bom e barato”.