Fim da obrigatoriedade de autoescolas: veja os argumentos a favor e os contra a mudança

O fim da obrigatoriedade da autoescola para obter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) está em discussão - uma consulta pública foi aberta na última quinta-feira (2). O episódio da sexta-feira (3) do podcast O Assunto apresentou dois pontos de vista diferentes sobre o fim da obrigatoriedade: um a favor e um contra. Na conversa com Natuza Nery, Paulo Cesar Marques da Silva apresentou argumentos a favor do fim da obrigatoriedade. Doutor em Estudos de Transporte pela Universidade de Londres e professor da UnB, Paulo afirma que o alto número de acidentes no Brasil mostram que não há evidências de que o sistema atual seja eficaz. Para ele, o que acontece hoje é: por causa do alto custo para tirar a carteira de motorista, há uma "fuga do processo de habilitação". OUÇA A PARTIR DO MINUTO 4:18 NO PLAYER ACIMA. Os argumentos contrários à medida foram expostos por David Duarte Lima, doutor em segurança de trânsito pela Universidade Livre de Bruxelas. Para ele, as autoescolas são importantes pois representam o primeiro contato "formal" com a legislação de trânsito, com o conceito de direção defensiva e para o desenvolvimento de habilidades para conduzir um veículo. OUÇA A PARTIR DO MINUTO 18:11 NO PLAYER ACIMA. Argumentos a favor da medida Fuga do sistema: Paulo diz que o alto custo e a burocracia envolvida no processo para tirar a carteira de motorista provoca uma "fuga do sistema". Na avaliação dele, essa fuga é um risco maior para o trânsito do que o processo de flexibilização para tirar a CNH; Alto custo como barreira de acesso: para obter a CNH, o custo pode passar de R$ 4 mil em alguns estados brasileiros. "Esse valor afasta muitas pessoas que precisam de habilitação para trabalhar e sustentar a família", argumenta. A medida proposta é vista por ele como uma "democratização para obtenção da habilitação", permitindo que mais pessoas sejam avaliadas pelo poder público no momento de obter a carteira de motorista; Outros modelos: Paulo citou exemplos de países que são referência em segurança no trânsito, como os países escandinavos e o Reino Unido. Nestes países, não há um processo rígido de obrigatoriedade de autoescolas, mas sim nos testes práticos e teóricos. Além disso, há fiscalização eficiente para impedir que condutores não habilitados circulem; Cultura: Paulo argumenta que as causas do alto número de acidentes estão mais ligada ao comportamento de motoristas no trânsito do que à formação técnica. Ele cita atitudes agressivas, falta de cidadania e de respeito no trânsito como parte das causas dessa alta de acidentes. "É um problema de educação da sociedade como um todo, que a autoescola não resolve sozinha", afirma; Qualidade do exame prático: para ele, a qualidade do exame prático para motoristas tirarem a CNH é deficiente. Paulo é crítico ao modelo atual adoto no Brasil, principalmente para motociclistas. Segundo ele, atualmente os testes consideram mais a habilidade de controlar a moto em baixa velocidade do que em situações "reais" de trânsito. Ele dá o exemplo do Reino Unido, onde o teste é feito em vias públicas, com o condutor enfrentando condições reais. Argumentos contra a medida Falta de plano de substituição: David usa a metáfora de que "a gente não destrói uma casa velha antes de construir uma nova" para dizer que ainda não há um plano de modelo concreto para substituir a obrigatoriedade das autoescolas. "Antes de a gente mudar de modelo, é preciso fazer isso com muito cuidado", diz; Papel das autoescolas: Ele considera que as autoescolas têm papel fundamental na formação dos condutores, pois são o local onde o candidato a motorista tem o primeiro contato estruturado com conceitos essenciais como legislação de trânsito, direção defensiva e as habilidades iniciais para conduzir um veículo. Para David, a autoescola é uma "sala de aula que anda", e aponta que o instrutor "precisa orientar a atenção do aluno, com uma didática complexa". David reforça a necessidade de um sistema de ensino robusto, e não o enfraquecimento dele; Qualidade das autoescolas: Para David, o problema está na qualidade atual das autoescolas, com instrutores mal preparados, e que "ensinam mal". David admite que o sistema atual forma motoristas com habilidades ruins. No entanto, ele vê esta falha como um argumento para reformar e melhorar o sistema, e não para abandoná-lo; Modelo espanhol: Ele usa o exemplo da Espanha, onde o trânsito era muito violento e a solução não foi eliminar a formação obrigatória, mas sim investir maciçamente nela. David relembra que o país definiu o que seria o perfil de um bom condutor e, depois, focou em melhorar a capacitação dos instrutores, buscando apoio universitário para criar materiais de alta qualidade. O resultado foi uma queda de 80% na mortalidade no trânsito em menos de 10 anos, segundo David; Alto custo: Embora reconheça que o alto custo é uma barreira real para a população de baixa renda, David alega que o valor total para tirar a CNH não é composto apenas pelo treinamen

Out 5, 2025 - 00:30
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Fim da obrigatoriedade de autoescolas: veja os argumentos a favor e os contra a mudança

O fim da obrigatoriedade da autoescola para obter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) está em discussão - uma consulta pública foi aberta na última quinta-feira (2). O episódio da sexta-feira (3) do podcast O Assunto apresentou dois pontos de vista diferentes sobre o fim da obrigatoriedade: um a favor e um contra. Na conversa com Natuza Nery, Paulo Cesar Marques da Silva apresentou argumentos a favor do fim da obrigatoriedade. Doutor em Estudos de Transporte pela Universidade de Londres e professor da UnB, Paulo afirma que o alto número de acidentes no Brasil mostram que não há evidências de que o sistema atual seja eficaz. Para ele, o que acontece hoje é: por causa do alto custo para tirar a carteira de motorista, há uma "fuga do processo de habilitação". OUÇA A PARTIR DO MINUTO 4:18 NO PLAYER ACIMA. Os argumentos contrários à medida foram expostos por David Duarte Lima, doutor em segurança de trânsito pela Universidade Livre de Bruxelas. Para ele, as autoescolas são importantes pois representam o primeiro contato "formal" com a legislação de trânsito, com o conceito de direção defensiva e para o desenvolvimento de habilidades para conduzir um veículo. OUÇA A PARTIR DO MINUTO 18:11 NO PLAYER ACIMA. Argumentos a favor da medida Fuga do sistema: Paulo diz que o alto custo e a burocracia envolvida no processo para tirar a carteira de motorista provoca uma "fuga do sistema". Na avaliação dele, essa fuga é um risco maior para o trânsito do que o processo de flexibilização para tirar a CNH; Alto custo como barreira de acesso: para obter a CNH, o custo pode passar de R$ 4 mil em alguns estados brasileiros. "Esse valor afasta muitas pessoas que precisam de habilitação para trabalhar e sustentar a família", argumenta. A medida proposta é vista por ele como uma "democratização para obtenção da habilitação", permitindo que mais pessoas sejam avaliadas pelo poder público no momento de obter a carteira de motorista; Outros modelos: Paulo citou exemplos de países que são referência em segurança no trânsito, como os países escandinavos e o Reino Unido. Nestes países, não há um processo rígido de obrigatoriedade de autoescolas, mas sim nos testes práticos e teóricos. Além disso, há fiscalização eficiente para impedir que condutores não habilitados circulem; Cultura: Paulo argumenta que as causas do alto número de acidentes estão mais ligada ao comportamento de motoristas no trânsito do que à formação técnica. Ele cita atitudes agressivas, falta de cidadania e de respeito no trânsito como parte das causas dessa alta de acidentes. "É um problema de educação da sociedade como um todo, que a autoescola não resolve sozinha", afirma; Qualidade do exame prático: para ele, a qualidade do exame prático para motoristas tirarem a CNH é deficiente. Paulo é crítico ao modelo atual adoto no Brasil, principalmente para motociclistas. Segundo ele, atualmente os testes consideram mais a habilidade de controlar a moto em baixa velocidade do que em situações "reais" de trânsito. Ele dá o exemplo do Reino Unido, onde o teste é feito em vias públicas, com o condutor enfrentando condições reais. Argumentos contra a medida Falta de plano de substituição: David usa a metáfora de que "a gente não destrói uma casa velha antes de construir uma nova" para dizer que ainda não há um plano de modelo concreto para substituir a obrigatoriedade das autoescolas. "Antes de a gente mudar de modelo, é preciso fazer isso com muito cuidado", diz; Papel das autoescolas: Ele considera que as autoescolas têm papel fundamental na formação dos condutores, pois são o local onde o candidato a motorista tem o primeiro contato estruturado com conceitos essenciais como legislação de trânsito, direção defensiva e as habilidades iniciais para conduzir um veículo. Para David, a autoescola é uma "sala de aula que anda", e aponta que o instrutor "precisa orientar a atenção do aluno, com uma didática complexa". David reforça a necessidade de um sistema de ensino robusto, e não o enfraquecimento dele; Qualidade das autoescolas: Para David, o problema está na qualidade atual das autoescolas, com instrutores mal preparados, e que "ensinam mal". David admite que o sistema atual forma motoristas com habilidades ruins. No entanto, ele vê esta falha como um argumento para reformar e melhorar o sistema, e não para abandoná-lo; Modelo espanhol: Ele usa o exemplo da Espanha, onde o trânsito era muito violento e a solução não foi eliminar a formação obrigatória, mas sim investir maciçamente nela. David relembra que o país definiu o que seria o perfil de um bom condutor e, depois, focou em melhorar a capacitação dos instrutores, buscando apoio universitário para criar materiais de alta qualidade. O resultado foi uma queda de 80% na mortalidade no trânsito em menos de 10 anos, segundo David; Alto custo: Embora reconheça que o alto custo é uma barreira real para a população de baixa renda, David alega que o valor total para tirar a CNH não é composto apenas pelo treinamento em autoescolas. O processo também inclui avaliação psicológica, exame médico e as taxas do Detran, indicando que a simples remoção da obrigatoriedade da autoescola não eliminará o problema do custo para tirar a carteira de motorista. O podcast O Assunto é produzido por: Mônica Mariotti, Amanda Polato, Sarah Resende, Luiz Felipe Silva, Thiago Kaczuroski e Carlos Catelan. Apresentação: Natuza Nery. Por que é uma boa ideia mudar processo de obtenção da CNH? O Assunto é o podcast diário produzido pelo g1, disponível em todas as plataformas de áudio e no YouTube. Desde a estreia, em agosto de 2019, o podcast O Assunto soma mais de 168 milhões de downloads em todas as plataformas de áudio. No YouTube, o podcast diário do g1 soma mais de 14,2 milhões de visualizações. Imagem de arquivo mostra carros de autescola Reprodução/TV Globo